15 de março de
2012
Meu Ódio Será Tua Herança
Quem observa com atenção a história da Europa, dos Estados Unidos da
América e dos povos semitas pode constatar que a violência não é
estranha ao seu passado. Ainda no século 20, enquanto os europeus do rei
belga Leopoldo II barbarizavam o Congo, americanos bombardeavam os
filipinos e judeus massacravam palestinos para retirá-los de aldeias
onde haviam vivido por séculos.
Desde o início do novo milênio, não se passa um dia sem que o eixo
Estados Unidos/Organização do Tratado do Atlântico Norte/Israel desfira
petardos contra diferentes regiões do planeta, matando ou mutilando
dezenas de seres humanos. Essa postura política vem chamando a atenção
de analistas e líderes mundiais, a ponto do atual primeiro-ministro e
futuro presidente da Rússia, Vladimir Putin, ter se referido
recentemente a um “culto da violência”.
No último domingo, dia 11 de março, um dia como outro qualquer na vida
do planeta Terra, mais de uma centena de seres humanos – em sua grande
maioria mulheres, crianças e cidadãos civis – foram massacrados em
decorrência de ações militares planejadas, coordenadas e executadas pelo
eixo EUA/OTAN/Israel no Iêmen, no Afeganistão e na Palestina, não por
acaso países de orientação religiosa islâmica que se opõem à política
expansionista de Israel.
Esta doutrina da violência tem raízes profundas na história desses
povos. Os Estados Unidos da América, um País cujo nome já denuncia a sua
doutrina calcada no “destino manifesto” de dominação e indica o desejo
da parte representar o todo, possuem uma longa história de massacres,
que têm origem na conquista do seu território, quando se aplicou de
forma sistemática o aniquilamento das grandes nações indígenas que
habitavam o norte do continente.
Embora os mal intencionados meios de comunicação dos dias atuais façam
vista grossa diante dos massacres de populações do Paquistão,
Afeganistão, Iraque, Somália e Líbia, dizimadas por meio de mísseis
teleguiados, aviões não tripulados e bombas despejadas por aviões e
helicópteros, é impossível deixar de recordar os inúmeros episódios de
extermínio dos habitantes nativos da América do Norte narrados nos
filmes ianques.
Um artesão do cinema de Hollywood, Ralph Nelson, registrou de forma
dramática o massacre de Sand Creek, em que centenas de Cheyenne e
Arapaho foram aniquilados pela cavalaria do exército dos Estados Unidos.
O filme Soldier Blue (Quando é Preciso Ser Homem) narra o episódio
ocorrido em 1864, quando as tropas comandadas pelo Coronel John
Chivington atacaram uma aldeia de indefesos Cheyenne e Arapaho,
exterminando centenas de homens, mulheres e crianças. Realizado em 1970,
mais de cem anos após o acontecimento, o filme surpreendeu pela
descrição gráfica da violência, mostrando cenas de degola e de
fuzilamento pouco usuais no cinema de Hollywood até então, sobretudo
quando mostravam a crueldade dos colonizadores brancos contra os
nativos.
Hoje os colonizadores brancos já não matam de forma sistemática os
indígenas – embora essa prática ainda seja empregada no Brasil por
garotos cafajestes de classe média – mas se empenham de forma organizada
no massacre de populações inteiras de povos islâmicos no Oriente Médio,
na Ásia e na África. Com o advento das armas automáticas, dos mísseis
guiados por satélite e mais recentemente dos aviões não tripulados, as
vítimas se somam agora aos milhares e até aos milhões, tal como se
estima em relação ao número de mortos no Iraque.
Mais recentemente o filme Syriana (2006), produzido por Steven
Soderbergh para o cineasta Stephen Gaghan, mostrava como um míssil
teleguiado explodia uma limusine que conduzia, em alta velocidade, a
família de um príncipe herdeiro de poços de petróleo, que os Estados
Unidos não apreciavam, enquanto executivos assistiam o desfecho da cena
em seus escritórios de Washington.
Hoje, a realidade parece ser ainda mais assustadora: operadores
confortavelmente instalados em bases militares na região de San Diego
manejam uma espécie de joystick, semelhante aos que os jogadores de
videogames estão acostumados, para despejar centenas de toneladas de
bombas sobre populações desprotegidas em todo o mundo.
Ao mesmo tempo, soldados ignorantes e brutalizados pela droga e sob o
influxo de uma música reproduzida em alto volume nos seus fones de
ouvido invadem casas e fuzilam mulheres e crianças em pleno sono.
Todos esses perpetradores sabem que – embora haja um grande número de
“danos colaterais”, como são chamadas as mortes de pessoas que
aparentemente nada têm a ver com ações militares – jamais serão punidos
por seus crimes. Suas ações serão devidamente acobertadas por seus
chefes – que vão desde o oficial imediato até o presidente da República
– porque são realizadas em nome e em função de uma política de Estado.
Como a corrupção no Brasil, a violência nos Estados Unidos é parte do
modo de vida da sociedade americana.
Essa volúpia da violência foi exibida de forma espetacular em um outro
filme, The Wild Bunch (Meu
Ódio Será Tua Herança) realizado por Sam Peckinpah em 1969, com cenas
estilizadas e em câmera lenta, que encontram seu clímax no massacre
final da metralhadora. No entanto, uma observação atenta de
The Wild Bunch revela que sua
primeira sequência mostra como um grupo de crianças queima com requintes
de atrocidade um escorpião enquanto brinca e se diverte com o fato.
De forma alegórica, pode-se dizer que entre uma e outra cena tem
decorrido – num contínuo crescente – a história do Grande Irmão do
Norte.
Sérvulo Siqueira
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