17 de junho de 2023
No último dia 8 de junho deste ano de 2023,
o jornal Estado de Minas publicou uma série de matérias sobre
os discos Milagre dos Peixes (1973) e Milagre dos Peixes
ao Vivo (1974). Um dos artigos continha referência ao documentário
Milagre dos Peixes ao Vivo e apresentava diversas imprecisões e uma
calúnia proferida por um ex-participante do filme. Com o objetivo de esclarecer as imprecisões e responder à calúnia, escrevi ao Estado de Minas a carta a seguir, que infelizmente não foi publicada nas suas edições.
Prezados Senhores, A matéria “Em show histórico, Milton Nascimento
gravou 'Milagre dos peixes' ao vivo”, publicada no Estado de Minas na
última quinta-feira, dia 8/6/23, que cita o meu documentário Milagre dos
Peixes ao Vivo, contém algumas imprecisões, contradições e uma afirmação
caluniosa. Nesse mesmo dia, escrevi ao repórter Gabriel de
Sá fazendo observações sobre as imprecisões contidas no artigo e
pedindo-lhe que publicasse meu desmentido à informação caluniosa contida
no texto. (Veja a carta em anexo). Refiro-me especificamente à afirmação de Márcio
Borges: “Ele produziu algumas montagens desse filme, vendeu o material
para universidades no exterior...”, que é falsa e pode me trazer muitos
problemas legais. Como detenho apenas os direitos de imagem do filme,
estou impossibilitado de vender qualquer cópia desse trabalho. De outra
parte, devido a empecilhos criados pelos membros do Clube da Esquina,
que detêm os direitos sobre as músicas, também jamais pude exibir o
filme comercialmente. Como qualquer transgressão que eu cometa nesse
sentido poderá me trazer muitos problemas, pedi ao repórter Gabriel de
Sá que publicasse um formal desmentido, já que ele, depois de ouvir o
Márcio Borges, não me deu o benefício da dúvida para contestar essa
afirmação. Gostaria de lembrar que, na segunda-feira
5/6/23, fui procurado por e-mail pelo repórter Gabriel de Sá, que
desejava assistir ao meu filme sobre o show de Milton Nascimento.
Forneci-lhe, então, o meu telefone para que ele me procurasse caso
necessitasse de maiores esclarecimentos. Na oportunidade, também lhe
ofereci um exemplar de meu livro Milagre dos Peixes Ao Vivo- O livro do
filme, que narra o meu esforço para preservar e exibir o filme por quase
cinco décadas, mas não recebi qualquer resposta neste sentido. Na matéria publicada, o repórter preferiu, no
entanto, se restringir às palavras de Márcio Borges, que não tem mais
nenhuma relação formal com o filme há 29 anos, embora se possa dizer que
já está desligado de fato do projeto desde o ano de 1975, quando foi
editada a primeira versão do documentário. Márcio Borges afirma também que nunca mais
assistiu ao filme quando, na verdade, em 2007, me escreveu vários
e-mails propondo a compra de uma cópia do documentário que seria exibida
na sede do Clube da Esquina, a ser instalada no antigo Cine Santa
Tereza. Nesse sentido, enviei a Gabriel de Sá um capítulo do livro que
escrevi sobre o filme, onde parte dessa correspondência é reproduzida,
também sem obter qualquer comentário do repórter. Em outro trecho da matéria, Gabriel de Sá afirma
que o filme Milagre dos Peixes ao Vivo, publicado no meu site, foi
concluído no ano de 2000. Se ele tivesse se dado ao trabalho de assistir
à versão integral do filme de 72 minutos, veria que o documentário foi
na verdade finalizado em 2018, conforme indicam os créditos finais. O mesmo procedimento o repórter deveria ter
adotado em relação ao contrabaixista Novelli, que ele afirma não ter
participado do espetáculo Milagre dos Peixes ao Vivo, em São Paulo, em
1974. Se houvesse consultado os encartes do disco, do CD e lido os
créditos do meu documentário, teria constatado que o contrabaixista
Novelli, com seu nome verdadeiro de Djair de Barros e Silva, fez parte
da orquestra sinfônica que acompanhou Milton Nascimento no Teatro
Municipal de São Paulo. Gabriel de Sá demonstra também pouca atenção e
falta de espírito de pesquisa, ao reproduzir sem qualquer comprovação
uma afirmação de Márcio Borges: – Se não me engano, foi a primeira apresentação
de música popular no palco do Municipal. Uma simples pesquisa
na Internet comprovaria o que todo cidadão bem informado da cidade já
sabe, ou seja, que
muito
antes do histórico de show de Milton Nascimento vários artistas da
música popular já haviam se apresentado no Teatro Municipal de São
Paulo. Eu mesmo, enquanto estudava na Universidade de São Paulo, assisti
em 1968 a um espetáculo nesse mesmo teatro do grande pianista de jazz
Oscar Peterson. Da forma como está escrita, acredito que a
matéria apresenta claramente um ponto de vista distorcido e tendencioso
que pode proporcionar ao leitor a impressão de que Márcio Borges, de
forma generosa, me cedeu seus direitos no filme e que eu me prevaleci de
sua generosidade e auferi lucros com a venda do material para o
exterior, o que em absoluto não corresponde à veracidade dos fatos. Esta
suposição estaria completamente desligada da realidade porque durante
todo este tempo não obtive nenhum benefício financeiro com este trabalho
e, muito ao contrário, tenho pago todas as despesas decorrentes do
trabalho de outros profissionais para a preservação do material com meus
próprios recursos. Por outro lado, todas as tentativas de contato
com alguns membros do Clube da Esquina foram respondidas com o silêncio
ou indecorosas propostas de abdicação de meus direitos autorais da obra,
sob o argumento de que isto facilitaria a obtenção de um eventual
patrocínio. Estes e muitos outros fatos estão narrados no livro Milagre
dos Peixes Ao Vivo: o livro do filme, que publiquei em 2019. A verdade é que venho lutando durante quase 50
anos para preservar este filme porque, como pesquisador de cinema,
acredito que meu documentário Milagre dos Peixes Ao Vivo se constitui
provavelmente no único registro cinematográfico de um grande espetáculo
da era de ouro da MPB dos anos 1960 e 70 e, portanto, precisa ser
preservado. A propósito, lembro que um livro meu, que se constitui
em uma pesquisa sobre o filme que Orson Welles rodou no Brasil em 1942,
já foi objeto de uma matéria publicada no Estado de Minas. Venho trabalhando em jornais há muito tempo e em
setembro deste ano comemoro 60 anos do meu primeiro artigo, publicado em
1963 no então Correio de Minas, e sempre acreditei que um fundamento
básico do bom jornalismo é a doutrina da equidade em que – quando se
trata de pontos de vista divergentes – deve-se atribuir o mesmo tempo e
espaço às posições conflitantes. Infelizmente, não foi esse o
comportamento adotado pelo repórter Gabriel de Sá, que ouviu somente um
dos lados e – passadas mais de 72 horas – não se pronunciou até agora
sobre a minha solicitação de um desmentido diante de uma acusação
infundada. Tenho uma ligação de muitos anos com o
jornal Estado de Minas por via de meu tio Cyro Siqueira e de queridos
amigos como Geraldo Magalhães e Roberto Drummond. Em razão disso,
visitei dezenas de vezes a redação do jornal e tive a oportunidade de
conhecer muitos profissionais de alto gabarito como Amílcar de Castro e
Dídimo Paiva, entre muitos outros, que este veículo já teve no passado.
Como jornalista, cheguei mesmo a publicar alguns artigos no Segundo
Caderno e até mesmo uma poesia em homenagem a John Lennon. Fico, portanto, profundamente triste quando vejo
que meus direitos de expor um ponto de vista e me defender de uma
acusação falsa não foram respeitados nesta matéria. Cordialmente, Sérvulo Siqueira
Caso você queira saber mais sobre o filme, leia: Milagre dos Peixes ao Vivo: o livro do filme Caso você queira assistir ao filme, visite:
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