Vingança do Além

 

Vingança do além procura participar da critica do etnocentrismo que uma parte do cinema americano vem operando, sobretudo a partir de Um homem chamado cavalo. Embora conserve muitos elementos do western, sua visão dos índios já não é tão simplista – embora pareça às vezes simpática - quanto a dos filmes de John Ford, nem tampouco tão etnocêntrica ou esquemática quanto a da maioria dos fitas de faroeste.

Sabe-se que desde o fim da década de 60 este cinema - participando da melhor consciência intelectual americana – começou a operar uma descentralização, nem sempre de forma explícita, na sua visão tradicional da sociedade e da cultura americanas e a se voltar para as minorias étnicas até então esquecidas por Hollywood. Neste sentido, Vingança do além participa até certo ponto da visão de filmes como Willie Boy, Jeremiah Johnson, Pequeno grande homem, sem mencionar o já referido Um homem chamado cavalo, entre outros, que procuram repensar a cultura e a situação do índio dentro da sociedade dos Estados Unidos.

O personagem central desta produção americana - realizada no ano passado em território canadense – é um curandeiro de uma pequena aldeia, um xamã na visão mágico-religiosa indígena. Por trás da desgraça que vê se abater sobre seus próximos, o curandeiro descobre a presença de uma feiticeira, expulsa por seus antepassados há mais de duzentos anos pelo crime de ter matado o marido e filhos. A história se torna mais complexa quando o bruxo Velho Falcão suspeita que a vingança tramada pela feiticeira Dnosoqua certamente irá atingir seu neto Mike, importante funcionário de uma grande indústria, em Vancouver.   

No estilo narrativo do diretor canadense George McCowan – construído à maneira dos filmes de televisão – o elemento mais interessante é a utilização do repertório lingüístico do western – grandes planos e longas panorâmicas - que procuram estabelecer a confrontação e o desafio imposto pela relação homem/natureza. Por outro lado,  o diretor também soube estabelecer um equilíbrio necessário ao clima mágico do filme, de forma que este levasse ao desenlace final, ápice e clímax da película. Entretanto, sendo também um realizador de seriados de televisão. G. McCowan abusa de fusões de imagens e de lentes zoom, acreditando talvez que o clima fantástico e de mistério do filme dependeria do uso destes recursos.

Tendo como título original em inglês A sombra do falcão, que corresponde mais à realidade do filme, Vingança do Além apresenta  um regular trabalho de fotografia, que poderia ser melhor não fosse o excesso de filtros e o exagero nos efeitos de luz. E um elenco que conta com a presença de do cacique Chief Dan George, cujo rosto exibe em seus sulcos um pedaço da própria história do nativo norte-americano.

  

Sérvulo Siqueira

 

Publicada no jornal O Globo em 18 de abril de 1977