24 de setembro de 2018
O caminho inverso do PT
Para um país que – em outras
eleições presidenciais – preferiu Hermes da Fonseca a Rui
Barbosa, elegeu Eurico Gaspar Dutra contra Yedo Fiúza e
Eduardo Gomes, votou por Jânio Quadros contra o Marechal
Lott, optou por Fernando Collor ao invés de Leonel Brizola e
– por duas vezes consecutivas – derrotou Luís Inácio da
Silva numa competição contra Fernando Henrique Cardoso, não
será surpresa se daqui a aproximadamente 15 dias se decidir
por Fernando Haddad em desfavor de Ciro Gomes, permitindo
que o candidato do PT caminhe para um segundo turno onde
poderá ser derrotado por um dinossauro fascista. Para que isto venha a acontecer, no
entanto, o PT terá que enfrentar inúmeros obstáculos. A pretensão do partido de assumir a
hegemonia na esquerda vem sendo amplamente contestada pela
campanha de Ciro Gomes, que saiu na frente com propostas
como a taxação do capital especulativo, o gigantesco lucro
dos bancos, a retomada do pré-sal e uma nova reforma
previdenciária, além de um projeto que visa zerar as dívidas
de mais de 60 milhões de brasileiros no Serasa. O candidato Haddad – em uma atitude
pouco ética – copiou algumas propostas do candidato do PDT. Por outro lado, o PT – a despeito da
possibilidade de chegar ao segundo turno das eleições para
Presidente da República – enfrenta uma realidade muito dura
tanto nos pleitos para os governos dos estados quanto para
as representações legislativas: Assembleia Legislativa,
Câmara Federal e Senado da República. Subitamente, o partido que por quase
14 anos deteve o poder no Brasil se depara com a
possibilidade de ter sua representação política
profundamente reduzida. Uma amostra disso é o caso de Minas
Gerais, onde o atual governador Fernando Pimentel, que não
conseguiu se desvencilhar da herança maldita de seus
antecessores e se comportou em muitos casos com a mesma
subserviência diante do grande capital que Aécio Neves e
Antônio Anastasia, corre o sério risco de não ser reeleito. Uma situação idêntica tende a
ocorrer nas eleições representativas como, por exemplo, no
Rio de Janeiro onde o combativo senador Lindbergh Farias
provavelmente não será reconduzido. O fato é que a sobrevivência do
Partido dos Trabalhadores como uma grande agremiação
política está gravemente ameaçada neste momento. De outra parte, como o partido
durante o período em que permaneceu no poder não cumpriu as
promessas que fez e perdeu a confiança de grande parte da
população, só lhe restou como trunfo – seu mais valioso
capital eleitoral – a figura de Luís Inácio da Silva, que
desgraçadamente não pode ser utilizada como tal porque se
encontra preso em Curitiba. Como hoje não desfruta do mesmo
espaço que ocupava em tempos passados no campo da esquerda,
em razão da perda de confiabilidade e de sua postura
conservadora, o PT dá indicações de que começa a se inclinar
sutilmente para a direita, cultivando as simpatias do “deus”
mercado, como algumas declarações de seu candidato, Fernando
Haddad, parecem apontar.
Depois de afirmar que poderia
escolher um nome “pragmático” para o ministério da Fazenda e
anunciar que vai respeitar os “contratos perfeitos” nas
vendas das companhias brasileiras – referindo-se à aquisição
da Embraer pela Boeing – Haddad desautorizou Márcio
Porchman, autor do programa econômico de seu partido, e
segundo uma manchete do jornal
O Globo
“caminha para o Centro”.
O temor do PT é que – em vista da
rejeição de uma parcela considerável da população ao nome de
Haddad e ao Partido dos Trabalhadores, que em outros tempos
já foi chamado de Partido dos Banqueiros – uma parte do
eleitorado de Marina Silva e de Geraldo
Aidimim,
que vêm perdendo a preferência do eleitorado, possa se
voltar para a candidatura de Ciro Gomes, repetindo a prática
do voto útil que vem se tornando um hábito no país. Torna-se cada vez mais claro que o
PT joga, então, todas as suas fichas na eleição
presidencial.
Neste sentido, a mesma matéria do
Globo
comenta que Lula e o PT estariam preparando mais um “cavalo
de pau” no programa do partido, à semelhança da famosa
Carta aos Brasileiros
de 2002, visando cair nas graças dos eleitores mais
conservadores e chegar ao segundo turno para o bate-chapa
com Bolsonaro.
No seu exílio interior da prisão de Curitiba, onde se
encontra há vários meses, o ex-presidente Luís Inácio da
Silva deve ter muito tempo para pensar. Vamos esperar
que Lula não esteja por trás deste retrocesso político e
que – assim como teve a oportunidade de entrar para a
história pela porta da frente, com suas vitórias em 2002
e 2006 e um governo de algumas realizações – não saia
dela pela porta dos fundos, a pretexto de prolongar a
vida de sua agonizante criatura.
Sérvulo Siqueira
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