22 de fevereiro de 2019
A História se repete de novo sob
a sua face mais sinistra: nos próximos dias, uma ação concertada pelos
Estados Unidos e seus aliados de extrema-direita no subcontinente, com
claras intenções de provocar um país da região, poderá levar a um
conflito armado que deixará consequências desastrosas para todos os seus
habitantes.
O pretexto da “ajuda humanitária”
ao povo da Venezuela marca mais um episódio das intervenções
norte-americanas na América Latina, que provavelmente teve início em 15
de fevereiro de 1898, quando o navio
Maine, estacionado nas costas
de Havana, explodiu matando 268 homens.
A explosão foi atribuída a uma
mina marítima e, no final do século 19 como hoje, a imprensa desempenhou
um papel relevante na instigação do conflito ao apontar o dedo para a Espanha como responsável
pelo fato. William Randolph Hearst, um magnata dos meios de comunicação,
mais tarde celebrizado por Orson Welles no
Cidadão Kane, empenhou seus
jornais de imprensa marrom em uma campanha contra a Espanha, criando uma
atmosfera favorável à intervenção americana, aparentemente ao lado do
povo cubano − então liderado pelo poeta libertador José Martí − contra o
domínio espanhol.
A guerra dos Estados Unidos
contra a Espanha que se seguiu levou à independência de Cuba do jugo
espanhol mas mergulhou o país do Caribe em um processo de dominação pelo nascente
império norte-americano que só iria se encerrar em 1º de janeiro de
1959, quando Fidel Castro e seus companheiros derrubaram a ditadura de
Fulgencio Batista, um sargentão sem compostura que os gringos haviam
empossado alguns anos antes em um porta-aviões ancorado na baía de
Havana.
Começavam então as várias dezenas
de intervenções militares dos Estados Unidos na América Latina que, como
a que ocorre nos dias de hoje, se apresentam inicialmente como uma “ação
humanitária” mas terminam invariavelmente produzindo cruéis ditaduras a
serviço dos propósitos de pilhagens de nossas riquezas para o proveito
dos interesses norte-americanos.
Nos próximos dias, poderemos ser
testemunhas de mais um evento semelhante a tantos outros ocorridos ao
longo destes cerca de 120 anos em que os gringos encenaram episódios de
false flags, bandeiras falsas ao estilo dos velhos piratas de
antanho, em que se simulava um fato que na verdade encobria outras e
perigosas intenções como as chamadas ajudas humanitárias jogadas de
avião na Bósnia e na Nicarágua que continham armas destinadas aos seus
exércitos de mercenários em terra.
Nesse sentido, o governo russo
vem afirmando que nos últimos dias detectou a compra de metralhadoras,
granadas de mão e outros artefatos de
guerra no mercado europeu, além da constituição de forças especiais que estariam sendo levados para a fronteira da
Colômbia com a Venezuela, de onde seriam contrabandeados para o país
vizinho. O Brasil, que agora também conta com um títere norte-americano como
presidente, estaria participando igualmente dessa operação, obviamente
ilegal, e que não conta com o apoio das Nações Unidas ou de organizações
humanitárias como a Cruz Vermelha.
O país que comanda este jogo sujo
é presidido no momento por Donaldo
Trampo, um magnata bufão e racista que ao longo de sua carreira vem
conseguindo se manter à margem da lei, e que teria afirmado o seguinte
em uma reunião da Casa Branca, em 2017, segundo relato de Andrew McCabe,
ex-diretor do FBI (Federal Bureau of Investigation), publicado recentemente em livro:
─ O presidente falou então sobre a Venezuela. Este é um país com o qual
nós deveríamos entrar em guerra. Eles têm todo aquele petróleo e estão
na nossa porta dos fundos. E ele prosseguiu, divagando e dando ideias
sobre o que lhe vinha à mente.
Os Estados Unidos acabam de ser
derrotados no Oriente Médio – Afeganistão, onde negociam um acordo com o
Taliban; Iraque, que deseja o fim de suas bases militares no país, e na
Síria, onde Bashar Al-Assad já recupera quase todo o território perdido
para os terroristas financiados pelos EUA, Arábia Saudita e Israel – e,
como sabemos, chegaram até ser vergonhosamente humilhados na Somália
algum tempo atrás.
Esse país, que se apresenta como
“excepcional”, sem que consiga provar exatamente o que isto significa,
volta-se agora para a América Latina, que sempre considerou como seu
quintal, para nutrir vampirescamente sua economia combalida por
sucessivas guerras e uma colossal corrupção com a apropriação de imensas riquezas da
região: minerais preciosos, agricultura, água, mão de obra barata, etc.
Como tem acontecido em muitos
outros países, não conseguirão seu intento sem que antes tenham
realizado aquilo que sabem fazer melhor: matar milhares de civis
inocentes – homens, mulheres e crianças – e destruir hospitais, escolas,
estradas, aeroportos, instalações industriais, ou seja, toda a
infraestrutura da Venezuela, país que possui as maiores reservas de
petróleo do planeta.
Foram bem-sucedidos pela via
eleitoral na Argentina, Chile e Brasil por meio de sórdidos expedientes.
Fracassaram no entanto na Venezuela, onde Nicolás Maduro foi eleito em
junho de 2018 com quase 70% dos votos. Seguindo a velha máxima de Felipe
da Macedônia, pai de Alexandre, o Grande, de que “não há fortaleza que
resista se você fizer entrar nela um burro carregado de ouro” tentaram
subornar os militares na Venezuela mas não conseguiram mais do que
algumas parcas adesões.
Da acordo com várias informações,
têm posicionado no momento uma força-tarefa comandada por um
porta-aviões nuclear nas costas da Venezuela. Será que se arriscarão a
uma aventura militar em um país que vem se preparando há algum tempo
para uma possível invasão, como já afirmou várias vezes o ministro da
Guerra Vladimir Padrino?
Como mencionou uma vez o grande
Millôr Fernandes, “temos um grande passado pela frente”. Continuaremos,
então, a
ser parte do quintal desses gringos?
Sérvulo Siqueira
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