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16 de abril de
2013
Venezuela sob cerco
A princípio, parecia impossível que isto pudesse acontecer mas, na
verdade, faltou muito pouco para que Henrique Capriles Radonski, um
político vinculado à extrema-direita e financiado pelos Estados Unidos,
pudesse convencer a maioria dos eleitores da Venezuela de que ele, sim,
era o legítimo herdeiro de Hugo Chávez e o continuador de seus projetos
de amplo espectro social.
Enquanto cabia a Nicolás Maduro, o sucessor escolhido pelo líder da
revolução bolivariana, o ônus da violência no país, da corrupção e da
ineficiência administrativa, Capriles Radonski – um filho da alta
burguesia que por décadas se apropriou do fruto do trabalho dos
venezuelanos mais humildes – dava à sua campanha o nome do inspirador de
todo o processo revolucionário, assumia o compromisso de continuar os
programas bolivarianos e, dentro de sua estratégia de farsa e embuste,
chegava até a propor a concessão de títulos de cidadania aos médicos
cubanos que no passado haviam sido o objeto de sua ira e escárnio.
Esta encenação, no entanto, durou pouco. Seguindo um plano previamente
elaborado, logo após a divulgação dos resultados o candidato de direita
desconheceu a contagem de votos que lhe era desfavorável e – após propor
a Maduro um pacto, que foi rejeitado – parece estar hoje por detrás dos
inúmeros ataques armados e incêndios perpetrados nas últimas horas
contra prédios públicos e sedes do Partido Socialista Unido da Venezuela
(PSUV) em claros atos de provocação, que já produziram até agora sete
mortes, contra os ganhadores das eleições.
Desde a tarde e a noite do último dia 15 de abril, hordas armadas vem
atacando mercados populares de abastecimento, centros de atendimento
médico, postos de gasolina, residência de governadores de vários estados
e sedes do PSUV em toda a Venezuela. Paralelamente, o presidente eleito
alerta para a gestação em marcha de um golpe de estado de caráter
fascista semelhante ao que se produziu há exatos 11 anos e que persiste
ainda como um trauma para a maioria dos habitantes do país.
Todo este caos está sendo orquestrado de fora da Venezuela,
especialmente pelas agências de desestabilização política americanas e
suas ramificações no Peru, na Colômbia, em El Salvador e no México, que
contribuem com apoio logístico e grupos de paramilitares experientes e
treinados, alguns deles com participação em guerras civis ocorridas no
subcontinente latino-americano. O objetivo certamente seria a criação de
uma atmosfera de ingovernabilidade que levasse a uma guerra civil
neste rico país dotado das maiores reservas de petróleo do planeta, num
processo semelhante ao que já foi executado na Líbia e está sendo
fabricado no momento na Síria.
Enquanto o governo de Nicolás Maduro terá que se defrontar com sua
obrigação constitucional de manter a ordem, muitos se dedicam a analisar
como em um período tão curto o atual presidente perdeu o apoio popular
que desfrutava logo após a morte de Chávez, quando as pesquisas
eleitorais consideravam que alcançaria uma vantagem de quase 20 pontos
sobre seu adversário.
De acordo com os resultados das últimas eleições, os amplos programas
sociais implementados por Chávez – assistência médica gratuita e
educação pública, construção de mais de 200 mil casas no ano passado,
melhoria do sistema de transportes, nacionalização de empresas sem
finalidade social, projetos de qualificação e aperfeiçoamento
profissional, entre muitos outros – não foram suficientes para
conquistar uma ampla maioria da população para seu candidato.
Por outro lado, podemos observar que na batalha pela criação de matrizes
de opinião pública a tática empregada pela candidatura de Capriles
Radonski parece ter se saído vitoriosa ao incutir na população o
sentimento de que – a despeito dos inúmeros programas sociais que o
candidato afirma apoiar – graves problemas como a violência, a corrupção
e a ineficiência administrativa ainda persistem no país. Neste sentido,
os apagões elétricos, o desabastecimento de muitos produtos básicos e
claros sinais de corrupção dentro do aparelho do Estado contribuíram
para este sentimento.
O Governo alega que todos estes sinais foram provocados e são o
resultado de ações de sabotagem planejadas de fora e executadas por
indivíduos treinados em atos de terrorismo e, dado o retrospecto de
fatos anteriores ocorridos na Venezuela e em outros países, é muito
provável que isto seja realmente verdade. Como sabemos, a nossa
história está carregada de acontecimentos semelhantes aos que estão
ocorrendo no momento na Venezuela e todos eles levaram a processos de
desestabilização que culminaram com a derrubada de governos
constitucionais na América Latina.
Articula-se neste momento no país vizinho ao nosso um cerco que pode se
ampliar se não for contido o mais rapidamente possível. Espera-se que o
Governo saia da posição defensiva em que se encontra no momento, tome
enérgicas medidas responsabilizando criminalmente os terroristas e
implemente projetos que conquistem de imediato o apoio da população,
restaurando no prazo mais curto a governabilidade e a eficiência do
Estado.
Entre as muitas análises já realizadas sobre a amarga vitória do último
14 de abril, várias delas coincidem em que uma das causas para o
surpreendente resultado deve ser atribuída a atos de sabotagem que podem
ter sido realizados por funcionários públicos, corrompidos por agentes
americanos e asseclas de Capriles Radonski.
Este fato torna-se claro quando se observa o comportamento do sistema
bolivariano de comunicação e informação – um projeto tão caro a Hugo
Chávez – que não se conduziu como deveria, falhando em prover a
informação quando necessário e permitindo que o candidato opositor, um
cafajestezinho de quinta categoria se apresentasse como um estadista e
quase conquistasse a maioria dos votos da população. Para isto, também
devem ter contribuído os marquetólogos, muitos deles brasileiros, mais
acostumados a vender políticos e programas de governo como se fosse o
sabão em pó que lava a roupa do filhinho.
Faltou a Nicolás Maduro e sua equipe de herdeiros de Chávez a
clarividência do grande líder vietnamita Ho Chi Minh, que afirmou certa
vez:
– Se eu quero os
fins eu também quero os meios compatíveis com estes mesmo fins.
Sérvulo Siqueira
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